
Ano 2 | Março de 2025
Grupo Corpo - 50 anos da maior companhia de dança moderna brasileira

Revista Mundaréu, 01 de fevereiro, 2025
Sugestão de pauta: Miriam Pederneiras. Fotos: José Luiz Pederneiras
Foi em Belo Horizonte, na década de 1970, que nasceu a companhia que revolucionaria a dança no país. Isso aconteceu há meio século, quando a capital mineira ainda enfrentava dificuldades para se impor no meio artístico nacional, então concentrado principalmente no eixo Rio-São Paulo. Na época, dizia-se que, para fazer sucesso no Brasil, era preciso sair de Minas.
Foi neste cenário que, em 1975, o Grupo Corpo despontou e, em 1976, levou ao público seu primeiro espetáculo, Maria Maria, com coreografias do argentino Oscar Araiz. A montagem, com trilha sonora composta por Milton Nascimento e textos de Fernando Brant estreou poucos anos após o lançamento do álbum Clube da Esquina (1972), o primeiro do icônico movimento musical. Assim, unidas, essas duas expressões artísticas cinquentenárias, Corpo e Clube da Esquina, trataram logo de reforçar a presença de Minas Gerais no panorama cultural nacional e internacional.
A formação inicial do Grupo Corpo contava com apenas doze bailarinos: Carmem Purri, Déa Márcia de Souza, Denise Stutz, Fernando Castro, Hugo Travers, Izabel Costa, José Luiz Pederneiras, Mariza Pederneiras, Miriam Pederneiras, Pedro Pederneiras, Rodrigo Pederneiras e Simone Coelho. Na direção-geral, o enigmático Paulo Pederneiras, que sempre assinou a cenografia e a iluminação dos os espetáculos da companhia.
Foi ele quem, há 50 anos, acompanhado do letrista e amigo Fernando Brant, convidou Milton Nascimento para compor a trilha do primeiro espetáculo, coreografado por Araiz. E o resultado foi grandioso, o Grupo Corpo ganhou projeção mundial com Maria Maria, que ganhou os palcos dos mais importantes teatros de 14 países e ficou mais de uma década em cartaz. Mais tarde, a bem-sucedida parceria se renovou com o espetáculo Último Trem.

Alerta de spoiler: no documentário "Bituca – Milton Nascimento", de Flavia Moraes, que estreia em março nos cinemas, Rodrigo Pederneiras revela que a música tema do espetáculo foi composta por Milton durante uma viagem de trem.
ÁGUAS PASSADAS QUE AINDA MOVEM MOINHOS
Poucos sabem que a relação da família Pederneiras com a dança começou bem antes da fundação do Grupo Corpo. O ponto de partida teve como cenário o centenário casarão neoclássico do Colégio Arnaldo, no bairro Funcionários, em Belo Horizonte, onde funcionava a escola de dança da bailarina e professora Marilene Martins, a Nena, pioneira do balé moderno na capital mineira.
Naquele tempo, para incentivar a participação masculina na dança, ela oferecia bolsas integrais. Os irmãos Pederneiras, então adeptos da capoeira, aceitaram o desafio e passaram a integrar o Grupo Transforma, de Nena.
Em 1973, durante o Festival de Inverno de Ouro Preto, eles conheceram o trabalho do coreógrafo Oscar Araiz e, para concretizar os planos de criar o espetáculo Maria Maria, decidiram formar um grupo profissional.
Após a experiência de sucesso, Rodrigo Pederneiras tornou-se o coreógrafo oficial da companhia e Paulo tratou de convencer seus pais, Manuel de Carvalho Barbosa e Isabel Pederneiras Barbosa, a cederem a casa da família, na Rua Barão de Lucena, no bairro Serra, para abrigar a sede inicial do Grupo Corpo. No mesmo local, fundaram o Corpo Escola de Dança Livre, que além de oferecer aulas para todas as idades, passou também a formar novos bailarinos para a companhia.
Com o tempo, o grupo e a escola cresceram e uma nova sede, projetada pelo arquiteto ouro-pretano Éolo Maia (1942-2002), foi construída no bairro Mangabeiras. Foi lá que Rodrigo Pederneiras estreou como coreógrafo com Cantares, espetáculo com trilha do compositor mineiro Marco Antônio Araújo (1949-1986).
Desde então, o Grupo Corpo não se cansa de acumular sucessos e conquistar plateias. Em meio século de existência, já realizou 24 espetáculos e se apresentou nas mais conceituadas casas de espetáculos de mais de 40 países. Além das coreografias de Rodrigo e da direção-geral, cenografia e iluminação de Paulo, suas montagens destacam-se também pelos figurinos, cenários, e pelas trilhas sonoras ousadas, na maior parte das vezes, assinadas pelos mais conceituados compositores nacionais.
ESPETÁCULOS E PARCERIAS DO GRUPO CORPO
1976 - Maria Maria – Música de Milton Nascimento.
1978 - Último Trem – Música de Milton Nascimento.
198 - Cantares – Música de Marco Antônio Araújo.
1985 - Prelúdios – Música de Frédéric Chopin.
1989 - Missa do Orfanato – Música de Wolfgang Amadeus Mozart.
1992 - 21 – Música de Marco Antônio Guimarães, interpretada pelo Uakti.
1993 - Nazareth – Música de José Miguel Wisnik, baseada em obras de Ernesto Nazareth.
1994 - Sete ou Oito Peças para um Ballet – Música de Philip Glass, interpretada pelo Uakti.
1996 - Bach – Música de Marco Antônio Guimarães, inspirada na obra de J.S. Bach.
1997 - Parabelo – Música de Tom Zé e José Miguel Wisnik.
1998 - Benguelê – Música de João Bosco.
2000 - O Corpo – Música de Arnaldo Antunes.
2002 - Santagustin – Música de Tom Zé e Gilberto Assis.
2004 - Lecuona – Música de Ernesto Lecuona.
2005 - Onqotô – Música de Caetano Veloso e José Miguel Wisnik.
2007 - Breu – Música de Lenine.
2009: Ímã – Música do trio +2 (Moreno Veloso, Domenico Lancellotti e Kassin).
2011 - Sem Mim – Música de Carlos Núñez e José Miguel Wisnik, baseada em obras de Martín Codax.
2015 - Dança Sinfônica – Música de Marco Antônio Guimarães.
2015 - Suíte Branca – Música de Samuel Rosa.
2017 - Gira – Música do grupo Metá Metá.
2019 - Gil – Música de Gilberto Gil.
2021 - Primavera – Música do grupo Palavra Cantada.
2022 - Gil Refazendo – Música de Gilberto Gil.
2023 - Estancia – Música de Alberto Ginastera.
AGENDA COMEMORATIVA DOS 50 ANOS DO CORPO
Hoje, ao observarmos toda sua trajetória, fica evidente que o Grupo Corpo, sob a batuta de Rodrigo e Paulo Pederneiras, soube conciliar com maestria o talento artístico fenomenal de seus criadores com uma incrível competência administrativa.
Está revelada a receita que tornou possível o surgimento da maior companhia de dança moderna brasileira, que estreia novo espetáculo em agosto deste ano, em São Paulo, e segue em turnê, como de costume, por várias outras cidades do Brasil e do mundo.
Desta vez, dois coreógrafos vão assinar partes distintas de uma mesma montagem, Rodrigo e Cassi Abranches. A trilha é de Clarice Assad, compositora, pianista e cantora brasileira, que desenvolve um trabalho que mistura música erudita, jazz e música popular brasileira.
Nas comemorações dos 50 anos da companhia, além do novo espetáculo, serão lançados também um documentário e um livro com a retrospectiva histórica e imagens captadas ao longo das cinco décadas de existência e sucesso do grupo que é de Belo Horizonte, de Minas, do Brasil e do mundo.
